Kiu Oliveira nasceu no distrito de Pilões, município de Candiba, Bahia, onde reside atualmente. É graduado em História pela Universidade do Estado da Bahia. Publicou o livro de crônicas Assombros de esperança (Editora Chiado Books) e o romance Anacrônicas dos silenciados (Caravana Editorial).

 

NÃO ERA GENTE

 

O romance Não era gente se passa em Pilões, distrito de Candiba, interior da Bahia, e conta histórias de um menino que, no final da década de 1980 e início dos anos 1990, tentou dirigir, nadar, voar, fez de tudo para se tornar gente. Entre um vão e outro, o menino não percebeu o tempo passar, e, quando se viu um homem-feito-faltando-pedaços, recorreu à memória, a única capaz de dobrar o tempo. Reviveu cada parte encontrada do quebra-cabeças do passado, como se fosse tudo o que lhe restasse. A família, os amigos, o quintal, a floresta, a barragem, as caçadas, o futebol, o dinheiro de carteira de cigarros, a chuva, a mesa, a máquina de costura, a falta... O livro costura muitas histórias, de um mundo que ficou para trás. “Nada permanece inteiro.”

 

Por Carla Dias

 

Quintal é terreno fértil, não apenas para os jardins ou as plantações para sustentar família. É nele que muitos aprendem a brincar de vida, e, diferentemente do que pensamos hoje, adultos dedicados a caber em um mundo hábil em complicar trajetos, na infância a curiosidade também dói na conta do virar o pé no corre para ver quem ganha; no planejamento dedicado para pegar colega no esconde; no amor pelo bicho de estimação que acaba no prato, na necessidade de entrar no rio, mesmo não sabendo nadar.


A história narrada neste livro se concentra no menino, no entanto, é na reflexão do adulto que ela faz seu papel de definir importâncias. Kiu Oliveira ambientou seu personagem em Pilões, distrito de Candiba, interior da Bahia, onde mora, um lugar de quintais, nos quais o menino encontra todo tipo de pessoa: grande, pequena, debochada, que vai embora mas liga, vai embora do mundo, mas fica, acha que precisa fazer de conta que é mais forte do que até mesmo o mais forte jamais seria capaz de ser. Também tenta descobrir o motivo de ainda não ter se tornado gente: “‘Quero ser gente’, pensei, e guardei o sonho no vão do peito”.


E o vão é esconderijo, feito o da máquina de costura da mãe, onde ele, menino, se perde na imaginação, e ao ser visitado por ele, o adulto hospedando vazio de quem não se reconhece no mundo, reencontra o inteiro de suas vivências.


Ler este livro pode levar o leitor a se perguntar: “o que é ser gente?”, e de uma maneira que reflete a vida de todos nós: provocando riso, cutucando dúvidas, alimentando curiosidade e saudade, lidando, da melhor forma possível, com a vida.