Mário Ramos nasceu em Guarujá (SP) em 1971. Poeta, tradutor de prosa e poesia russa, e professor de literatura russa no curso de Letras da Universidade de São Paulo desde 2010. Em sua experiência como tradutor, realizou traduções poéticas de diversos autores russos, como: Velimír Khlébnikov, Arséni Tarkóvski, Aleksándr Púchkin, Anna Akhmátova e outros. Como pesquisador, tem dedicado os últimos vinte e cinco anos ao estudo da poesia lírica em diferentes períodos, com ênfase na poesia de vanguarda e nas manifestações do gênero no decorrer do século XX. 

 

LABIRINTO DE VIDRO

 

Em Labirinto de Vidro o leitor acompanhará a formação e a posterior desconstrução de um labirinto multifacetado, espaço da história, da tradição da poesia lírica, do mito, dos processos mentais mais profundos. Nele habita um “eu” que se transmuta e pode também exibir muitas faces: a do herói, a do monstro que habita o dédalo e que ele próprio enfrenta e, em última instância, a do próprio labirinto. O espaço desse confronto é elaborado, em sua maior parte, por poemas curtos (o que deixa entrever uma filiação às poéticas de concisão), que dialogam com formas mais longas na composição dos contornos das paredes e becos do labirinto.

 

Por Paulo de Toledo

 

DEIXE O FRIO LÁ FORA


Omar Calabrese, em seu A Idade Neobarroca, fala do prazer da obnubilação, o prazer de se perder no labirinto. Obnubilemo-nos todos, percamo-nos para encontrar o prazer do texto, da textura, da tecitura. O poeta-minotauro, à vista de todos (mas de todos oculto sob espessas camadas de linguagem), em seu labirinto hialino, de paredes cuja estrutura é feita de silêncio e solidão, sem fio de Ariadne nem Teseu (mas há Eros, o artesão), tropeça nos móveis (lá tudo parece imóvel, menos a imaginação e a memória) e nos esfíngicos mistérios. Experto em construir pirâmides de areia nas praias de Santos, o poeta mata uma esfinge a cada esquina (sim, eu vi, ela está lá). No Catatau leminskiano, lê-se: “labirinto de enganos deleitáveis”. Não nos enganemos: para tirar deleite do labirinto do Mário, deve-se espremer a pedra, tirar deleite de perda, de pedra toantemente cabralina, preciosa como pérolas encasuladas em ostras enigmáticas. Pode entrar, mas deixe o fio lá fora.